sexta-feira, 17 de abril de 2015

Da janela...




Da janela...
Foi assim que tudo começou. Não a escrita, mas a imaginação. Ela provinha dos mistérios indecifráveis daqueles pensamentos que permeavam e invadiam sua mente. Ela não sabe bem quando isso tudo começou, talvez tenha sido inato, de nascença, assim como uma pinta, uma marca, como a personalidade, aquela quase sempre imutável. Desde pequena, sentada sempre no banco de trás do carro, ela ficava atenta a todos os caminhos, a todas as paisagens, a todos os gestos, a todos os pensamentos e a todos os acontecimentos. 
Ela não deixava quase nada passar... E deixava a paisagem passar e fazer sonhar. Sonhar...
Ela sempre sonhava com as paisagens, as da janela e das diversas outras que olhava. Ela admirava toda forma de paisagem, mesmo as mais feias, até essas eram fonte de inspiração e intriga interna. Com essas, ela indagava a justiça e as formas de aquilo ter um lado bom. Tirava proveito de qualquer prédio pichado, de qualquer estrada perdida, de qualquer árvore florida e de qualquer tempo virado. Sua imaginação dependia muito dos acontecimentos que rondavam a sua mente naquele exato instante, mas dependiam mais ainda da música que estava escutando, do tempo que fazia no momento, da vista que estava captando e principalmente da janela que via a vida passar. Eram diferentes janelas, foram inúmeras, perdeu de vista o número e a diversidade desses enquadramentos que a inspiraram tantas e tantas vezes. Da janela, ela se deixou levar, levou suas abstrações a outro nível, trouxe a tona suas dúvidas, quis responder os mistérios, formulou suas filosofias. Da janela, ela questionou, indagou, instigou, olhou, observou, chorou e amou.
Da janela, ela cresceu e principalmente amadureceu. Da janela, ela se despediu de amigos, viu passar os últimos momentos com o avô, repetiu alguns caminhos e muitas estradas, viajou na companhia de seus pais, viu chover, muitas vezes, viu chover, conversou com amigos, atravessou oceanos, despejou seus sentimentos, começou a escrever, começou a refletir, começou a imaginar. Das janelas iguais e repetidas, os caminhos eram sempre os mesmos, e não que ela se cansava, pelo contrário, foram de descobrimento pras novas emoções que surgiam. Dos mesmos lugares, os lugares que ela já tinha decorado, os prédios que já tinha avistado, as ruas que sabia de cor. Das novas janelas, essas incríveis janelas, janelas que já tinham sido tocadas por estranhos, admiradas por tantos outros seres humanos, essas continham uma nova informação, uma nova visão. Paisagens diferentes e por isso nova imaginação, uma diferente emoção. Essas serviam de constante admiração e, criavam maior contentamento, sentia com mais afinco a vontade de despejar e indagar toda essa conflituosa relação. Ah! Quanta emoção! Vinha a tona tudo aquilo que um dia já tinha vivido e o que teria pra viver. Um mix excelente para deixar qualquer um a ponto do excelentíssimo gozo da vida, da vontade de olhar pra trás e pra frente e estancar qualquer ferida, só de fazer sorrir, qualquer pequena criança, qualquer grande adulto, cheio de esperança, cheio de juventude! Cheio de sonhos! As janelas as vezes eram grandes, as vezes pequenas, as vezes foscas, as vezes brilhantes, as vezes com rede, as vezes a beira de abismos, as vezes altas e as vezes baixinhas, baixinhas. Delas, enxergavam homens grandes, homens pequenos, crianças, adultos, prédios, ruas, avenidas, lagos, árvores e até as coisas que muitas vezes não queremos olhar.
Das coisas que mais gostava de olhar, essas com certeza, eram as paisagens desconcertastes, as de tirar o fôlego, a de tirar qualquer um do foco. Mas ela olhava sempre além de tudo isso, olhava por trás do que tudo isso guardava, os mistérios e as intrigas, as perguntas não respondidas. Da janela, ela quis inspirar vidas, que não só fosse a sua, ela sentiu um motivo pra ir além daquilo tudo. Da janela, muitas coisas começaram e, muitas delas finalizaram. 
Da janela, ela começou esse texto e todos os outros.
Da janela, ela quis ver a vida passar e da janela ela tirou muitos ensinamentos. 
De todos eles, um ficou.
Que ela pode deixar a vida passar, principalmente se for da janela que dê de cara pra uma linda paisagem. 
Deixar a vida passar, mas desta vez não mais olhar através da janela.
A vida era mais do que apenas aquilo, mas é claro que ela não largou essa mania.
Agora ela caminha pra tentar enxergar de perto toda essa paisagem e todas as outras que ainda não conheceu, mas sabe, que de outras janelas, lhe aguardarão.

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